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domingo, 18 de agosto de 2013

ENCONTRO

(Google-Imagens)
“Bela, suave, olhos castanhos e o jeito de menina que me cativou imediatamente.” O momento exato da ocorrência do amor é dos maiores mistérios da humanidade. Na rua, no ônibus. No sinal de trânsito fechado ao ver o carro ao lado. Em instantes, tudo é observado, o olhar, o sorriso, o movimento de cabelos. Pronto, aconteceu. Nasceram um para o outro. Conforme os poetas, em coração aberto o amor entra sem bater.
Assim acontece com o jovem da história. Ela na parada de ônibus do SESC da 505 sul entrando em um taxi e ele preso no engarrafamento colossal da avenida W3 em um dia de setembro com dez por cento de umidade relativa e temperatura beirando trinta graus. Valdir baixa o vidro escuro do Gol e comenta algo ao  taxista. A resposta nem percebe, importante é a jovem que consulta nervosa o relógio sentada no banco de trás. O coração dispara.
Com o trânsito parado, sai de seu carro, abre a porta do taxi e senta ao lado da moça, sob protestos do profissional. Ela reage timidamente ao interlocutor audacioso. Pergunta o nome e ela fala o primeiro que vem a cabeça, o mesmo usado na internet quando prefere ficar anônima, Alice. Depois de uns quinze minutos de conversa, o trânsito recomeça a andar e Valdir oferece carona. Confere as horas, admite estar atrasada e aceita a oferta. Fala da prova na UNB enquanto o rapaz paga o taxi e a conduz pelo braço a seu carro, que a estas alturas, atrapalha o trânsito que flui normalmente.
A conversa segue fácil até a Universidade. Para Valdir a entrevista de emprego está perdida e o rapaz gentil se prontifica a levá-la de volta. A jovem aceita, abre a porta do carro e desce correndo rumo ao prédio da Filosofia.
Após rodar um bocado atrás de vaga, Valdir, retorna ao local onde deixou Alice e espera por quatro horas, tempo suficiente, acredita, para o término da prova.  A moça não aparece e ele se desloca ao prédio do curso. Solicita informações. O pouco que sabe é insuficiente para garantir novo encontro. Constata que Alice não consta na relação de alunos. No caminho de volta, se culpa por perder a oportunidade de pedir o telefone, endereço, qualquer coisa.
No outro dia e por um mês completo, deparou-se a espiar o local do primeiro encontro. Até hoje, lá vão dez anos, ao passar a parada de ônibus do SESC, onde a viu pela primeira vez, a procura entre os pedestres.
Na época, trocou o curso de Engenharia do Uniceub pelo da UNB. Completou o curso de Filosofia, o mesmo da jovem. Casou, teve dois filhos. Hoje, separado, declara aos amigos que só casa novamente se for com Alice.
“Até as pedras se encontram!” – Afirma e explica. “Meus pais se conheceram em um aeroporto na Europa, ambos em conexões”.

quinta-feira, 29 de setembro de 2011

DESCOBRINDO PORTUGAL – SEGUNDA PARTE





(Arquivo pessoal)


Todo dia o amanhecer em Portugal me obrigava a exercitar a consciência e localizar onde estava. A arquitetura de Coimbra, cidade onde dormíamos, guarda semelhanças com Salvador e Rio de Janeiro, conferindo que os portugueses aplicaram nas duas cidades brasileiras, ambas ex-capitais, a arquitetura que conheciam. Quem sabe para aplacar a nostalgia da terra natal. Se hoje, com potente meio de transporte, nos sentimos distantes, imagino em meados dos séculos XVI, XVII.
O passeio a Fátima aconteceu em um misto de curiosidade e obrigação. Amigos que souberam da programação de viagem, falavam com entusiasmo sobre o santuário fazendo comentários tipo “ir a Portugal e não visitar o Santuário de Fátima é morrer na praia”. Ora, pois, pois, então iremos. E mereceu um capítulo a parte pela magia e grandiosidade do local. Nem necessitou um dia inteiro e as impressões são relevantes de narrar.
Antes de tomar o ônibus para Fátima, Malu e eu almoçamos em Coimbra privilegiando frutos do mar. Pescada amarela, com salada e batata cozida, acompanhado de vinho do Porto, que nos deixou com uma ponta de preguiça. Observei que nas refeições não é costume servir arroz com a comida. Como não sou adepto do alimento, não senti falta. Após o almoço, seguimos para a rodoviária, onde esperava o que mais chamou atenção em solo português quando o assunto é transporte: ônibus confortável que contribuiu para a soneca depois do almoço. Dormir bem neste percurso de pouco mais de uma hora, garantiu que chegássemos novos em folha e, como a rodoviária é perto do santuário, nos deslocamos a pé, fazendo fotos da vegetação, semelhante à brasileira do sul.
Íamos distraídos quando, por detrás de árvores centenárias, surge o colossal prédio do complexo. Era o templo principal que nos impressiona pela grandeza. Os portugueses capricharam, com razão, a visita ao Santuário é responsável por dez por cento de todo turismo que acontece no país. Em 2005, chegaram a mais de 4 milhões de peregrinos. O templo da Santíssima Trindade, construção mais recente do complexo de templos tem capacidade para nove mil pessoas sentadas.
À frente da porta de duas toneladas, a grandiosidade do pátio central remete a miniatura de nosso significado como seres humanos. O número de pessoas que visitavam o complexo conosco, era significante, mas não preenchia o espaço a disposição. Mesmo neste enorme pátio, o silêncio era quebrado apenas pelos sussurros de orações na missa que acontecia na Capela das Aparições. Os peregrinos, gente de todas as classes sociais e de todos os países do mundo, estavam ali por diversos motivos. A maioria por motivações religiosas. Mas mesmo os que lá comparecem por outras finalidades, acabam se envolvendo em alguma atividade do ritual litúrgico, como assistir missa, sussurrar orações, andar ajoelhado penitência na passarela dos sacrifícios, colocar velas no castiçal ou depositar moeda de 50 centavos de euro na fenda do balcão de uma vitrine para acender uma vela elétrica, entre as centenas que ali estão instaladas.

Um prédio ao fundo, atrás da bastilha, abriga uma bateria de banheiros, bem cuidado e com papéis a disposição. Saliento por não estar acostumado com estes confortos no Brasil.
Em determinado momento, ao passarmos embaixo de um pinheiro, uma pinha desprendeu-se do galho e caiu com estrondo. Nunca vira uma daquele tamanho. Ficamos inertes por alguns instantes, admirando-a, mas logo Malu deu a idéia “vamos levar para o Brasil”. Apanhei-a do chão e se tornou nosso souvenir de Fátima. Não somos adeptos a comprar lembranças de pontos turísticos a preços exorbitantes.
Após cumprir a tradição de acender uma vela num tanque, começamos a nos afastar vagarosamente do templo, pois anoitecia e lá cerra suas portas as sete horas. Acompanhamos com o olhar alguém que, ajoelhado, fazia penitência dolorida arrastando com dificuldade os joelhos na pista dos sacrifícios. Ficamos longo tempo em silêncio, caminhando de mãos dadas, perdidos em reflexões sobre a fé humana e, seu significado, manifestações, símbolos e crenças.
Lanchamos perto do santuário, um doce chamado Feijão, feito com ovos moles. O passeio não ultrapassou três horas e logo estávamos retornando a rodoviária.
As oito da noite tomamos o ônibus e voltamos para Coimbra. Fátima foi ficando para trás com todo seu esplendor e significado litúrgico. Colossal monumento erguido ao povo crédulo que procura significado para a morte e sentido para a vida.
Antes de dormir entramos num pequeno restaurante, aconchegante, intimista, decorado com quadros do século XVIII. O dono, um senhor de meia idade, atendia pessoalmente seus clientes, que, pelo porte do local, não poderiam passar de vinte por vez. A apresentação do cardápio decorado com bom gosto. Atrás do balcão uma senhora que parecia sua mulher, esmerava orientando dois cozinheiros. Quase imperceptível, uma música francesa pairava docemente transformando o ambiente em algo preguiçoso. Pedi duas porções de caldo com grão de bico e legumes e, enquanto esperava, conversávamos sobre os acontecimentos do dia e seu significado. Na mesa ao lado uma moça de uns vinte e poucos anos, lia um livro com título francês. Tentei ler o autor, mas não consegui. As demais mesas estavam todas ocupadas. As conversas eram reservadas e contidas, e havia um limite de som aceitável entre os clientes. Passados trinta minutos, um jovem aparentando mais de trinta anos, entrou e se aproximou da moça do livro. Ela levantou para recebê-lo. Cumprimentaram-se com carinho e sentaram um de frente ao outro. Tentaram falar em português. Não deu certo. Em alemão não conseguiram ir muito longe. Acertaram o diálogo em francês. O sussurro dos dois, o vinho branco que pediram, o prato a base de lula, tornou a atmosfera romântica naquele canto do restaurante. Fomos contagiados e nos recolhemos cedo ao hotel. A noite fria em Portugal pode ser bem aconchegante.