foto 1 - Marco arquivo pessoal)
Quando viajei a Porto Alegre em maio deste ano, pressenti como seria o inverno de 2011. E confesso que frio não é minha praia. Quem gosta é turista. Por ter laços familiares, frequento a capital gaúcha mês sim, mês não, exceto no inverno. Pulo junho, julho e agosto. Em maio, o frio nem foi estas coisas, mas liguei a velha estufa da casa da mãe.
O melhor aquecimento vem do convívio com amigos em Porto Alegre. “E amigos de meus amigos são também amigos”. Constatei isto com Jorge, cuja amizade remonta aos tempos de infância. Vez por outra passamos meses sem conversar e no reencontro, iniciamos do ponto que parou. Amizade é isto, saber puxar o assunto que interessa ao outro. Perdemos contato, com minha mudança para Brasília. Anos depois o reencontro aconteceu graças a internet. Hoje em Porto Alegre, encontro o grupo do Jorge, Arturzinho, Chicão, judeuzinho e as duas Reginas.
Outro grupo Jorge queria me apresentar. Falava deles com amizade “são os pescadores da Vila Nova. Quando não planejam pescarias a Argentina, fazem churrascadas na casa do Laerte toda quarta-feira.” Apesar da curiosidade, faltava-me tempo. As idas a Porto Alegre são rápidas e plenas de compromissos.
Em dezoito de maio, a oportunidade chegou. Na hora combinada, Jorge e o filho Ivan, chegaram à porta de minha casa. Peguei casaco pesado esperando a friagem.
Por volta das sete entramos no estacionamento do sítio. Laerte preparava a churrascada. Ficamos bebericando um delicioso vinho artesanal enquanto o grupo chegava e as apresentações aconteciam. Receberam-me como se fosse integrado ao grupo há anos. A condição de morador de Brasília não foi poupada. Perguntaram se eu era deputado.
El extraño en la casa a su llegada es recibido con un asado gaucho y la amistad.
A casa do Velho Laerte, como o chamam, tem a cara do dono. Os convidados são recebidos num galpão com pé direito de cerca de três metros. Ao fundo, a churrasqueira estrategicamente na ponta mais estreita, com visibilidade de todo o ambiente, dando a Laerte a posição de timoneiro. Pela cor escura dos tijolos bem curtidos, a carne não pára de assar ali há muitos anos. Faz questão de pilotar a churrasqueira, preparar a carne, espetar, assar e, como manda a tradição gaúcha, servir a todos. “O açougueiro escolhe a melhor carne, separa e eu busco nas quartas-feiras” vangloria Laerte no alto dos 78 anos.
Ao centro, a mesa para cerca de vinte pessoas revela que o Velho gosta de receber. Na lateral, enorme e rústica estante, onde mantém objetos curiosos. Cada um com sua história.
Pacientemente, Laerte guarda aquilo que representou algo em sua vida. Predominam estatuetas de cavalos, aviões de aeromodelismo, fotos de aventuras, entalhes em madeira, livros, coleção da Delta Larousse, da Barsa, machadinha medieval, carrinhos em madeira, frascos diversos com ou sem líquidos. Sobram inutilidades como aparelhos elétricos, torradeira, forninho elétrico e televisor fora de uso. Todos com desculpas para estar ali, “um dia servirão para alguma coisa”.
Objetos que representan a un hombre salva a su historia de vida.
Saí para conhecer o quintal, que não é grande, mas muito charmoso. Um riacho ao fundo, com uma pequena ponte apresenta aos visitantes ares de casario europeu.
Quando retornei ao galpão, o churrasco era servido e a alegria imperava ao redor da mesa. Laerte fazia questão de levar carne aos convidados com carinho fraterno.
El viejo quiere inmortalizar los grandes momentos.
Sobre o grupo reunido, faço algumas observações, retiradas da visão do Jorge, que os conhece há mais tempo. A descrição foi baseada na foto 1 do grupo, da esquerda para a direita. Começa pelo uruguaio Gustavo, excelente cavaleiro e professor de equitação. Na pescaria é considerado principiante. É candidato, assim como eu, a frequentar os rios argentinos.
De boné azul, Capitão Carlos, filho do Laerte, o Milico, advogado, dono do ônibus que transporta os pescadores. O seguinte é Marco Aurélio, primo do Jorge, aposentado da Receita Federal, tem 71 anos “de luz negra”, como diz Jorge. Este é dos mais animados. Ao fundo, o Iloni, mais conhecido como Capivara ou simplesmente Capi. Sobre quem se conta a seguinte história acontecida num hotel da Argentina. Todos tomavam o café da manhã, quando Capi chama a garçonete e proclama “Yo quiero más queso” A moça respondeu prontamente, “Usted quieres es mantequilla, porque no hay queso”. Capivari nunca mais se viu livre das brincadeiras em cima deste mico portenho. Mas garante que leva na esportiva, como bom pescador.
De costas na foto, Édio, que trabalha numa loja de autopeças e está sempre de bom humor, um grande contador de histórias. Nunca foi visto carrancudo.
O próximo é Zezinho, que trabalha para o Milico, na chácara do Laerte. Já participou de algumas pescarias com a turma. Depois, Marco que participou de duas pescarias, seguido por Artur, advogado, considerado bom parceiro.
Logo após o Jorge, entusiasta destas amizades que cultiva desde menino. Considera Laerte seu segundo pai. Ao lado o filho Ivan, que apesar de freqüentar o grupo e comer churras, está em treinamento para se tornar pescador.
Na sequência, Marcão, engenheiro do DMAE, “ótimo pescador”, de acordo com o Jorge. A seguir Élder, o Bistrica, o maior contador de piadas da turma. Goza a cara de todo aquele que paga mico e, juntamente com Milico, campeão de idas a Argentina.
Por último o Vitalino, aposentado da CRT prestativo e baita parceiro. Dele contam um episódio que virou marca registrada. “Certa vez estávamos chegando a Corrientes, e Vitalino chamou a atenção para a baita cancha reta que surgia a esquerda. Todos olharam e a gargalhada foi geral. Era a pista de pouso do Aeroporto de Corrrientes. Ele envaretou. Mas bom cabrito não berra.” Vitalino disfarça toda vez que citam o mico nas reuniões. Pois confundir pista de corrida de cavalos com aeroporto...
Onze horas e a reunião perdeu força, afinal a maioria trabalhava no dia seguinte. Por mim varava a noite, afinal estava a passeio e queria ouvir as histórias. Saímos todos ao mesmo tempo, eles com a certeza do reencontro na próxima quarta-feira, eu, com convicção de que aumentei meu círculo de amizades. Unidos pela afeição, este grupo encontra tempo para curtir a amizade, num mundo cada vez mais individualista e solitário.
“Y ahora tengo la convicción de que amigos de mis amigos también son mis amigos.”
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