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domingo, 31 de julho de 2016

Cento / Ferrara / Itália - A Chegada

Estação de Parma - caminho a Cento

Há muito sonhava viajar no sentido contrário aos meus antepassados e conhecer a cidade de onde saíram. Enquanto preparava as malas para a viagem, imaginava a tensão que enfrentaram as vésperas da jornada rumo ao Brasil. Em 10 de fevereiro do ano de 1889, partiu o navio Solferino 1 do porto de Gênova. Levava o casal Giuseppe Tancredi Tassinari (23) e Adele Tassinari (20), meus bisavós, saídos de Cento, Itália,  rumo a Porto Alegre, Rio Grande do Sul. Como os pais de Adele impediram que viajasse solteira com o noivo, haviam casado pouco antes do embarque, em 6 de fevereiro. Entre os emigrantes, estavam apenas os pais de Giuseppe, Pacífico Tassinari (55) e Irene Turrini (53). A viagem, odisseia de aproximadamente 30 dias, enfrentou tempestades, calmarias perigosas, epidemias e dietas forçadas por racionamento de comida.
Estação de Samoggia- Caminho a Cento
Diferente de meus bisavós cheguei a Roma a partir de São Paulo, sem atropelos em dez horas de voo, incluso a escala em Frankfurt.
Iniciei a viagem em 06 de julho de 2016. A primeira parte, segui a programação da companhia de turismo. Visitei a capital Roma incluindo o Vaticano; Pompéia, a cidade devastada pelo vulcão Vesúvio em 79 d.C.; Nápoles, terra de Sophia Loren; a ilha de Capri e suas grutas milenares e a pré-histórica Florença. Passeei de gôndola em Veneza com direito a tenor e gaiteiro e caminhei pelas ruas da belíssima Verona, contemplado pela bela história mitológica Romeu e Julieta. Em Milão, conheci a moda sofisticada das grandes grifes mundiais.
Em 12 de julho, encerrou-se o roteiro turístico. Separei-me do grupo e iniciei a execução do plano de conhecer a terra de Giuseppe, que, por pressentimento me acompanhava abrindo portas invisíveis para o sucesso da empreitada.
Informei sobre como chegar a cidade de Cento. Parecia  simples. Saí do hotel em Milão às 09 horas da manhã do dia 13. Encontrei a estação Central de trens de Milão em movimento intenso de passageiros. Depois de andar para lá e para cá, tentando observar o movimento das pessoas nas máquinas para compra dos bilhetes, aceitei ajuda de um menino indiano aparentando doze anos. Disse chamar-se Ravi e falava dialeto incompreensível e italiano enroladíssimo. Nossa comunicação estava sofrível. Ravi e eu posicionamos em frente a máquina de comprar bilhetes. A primeira opção era escolher a língua de operação da máquina. Gesticulando, apontei o botão “espanhol”. Ravi deu de ombros, pressionou e a máquina desandou a dar opções de escolha: trem bala ou trem comum, primeira classe ou segunda, número de pessoas, horários, valores. Fomos escolhendo de acordo com as opções que apareciam e desapareciam a velocidade da luz. Ele tinha pressa. Eu espantado com tantas informações a processar.
Quando a engenhoca apresentou o custo final, enfiei a nota de 50 euros no escaninho. A máquina então imprimiu as passagens e cuspiu o troco. Ravi tentou orientar apontando o rumo da plataforma 21, indicada no bilhete. Peguei-o pelo braço e o fiz entender que seria necessário levar-me. Contrariado, o rapaz assentiu e saiu em disparada. Peguei a mala e saí serpenteando em meio a multidão. Levou-me até a plataforma e me fez ver que a partir dali me virasse. Estendeu a mão. Ofereci 3 euros. Foi embora insatisfeito, queria mais. Depois soube que existem atendentes da própria estação que ajudam a tirar bilhetes operando as máquinas. Sem cobrar nada.
Foram quase três horas no trem, razoavelmente confortável a Bolonha, onde cheguei as 14 horas. Com fome e certo nervosismo pela  aproximação do destino. O calor de Bolonha era intenso. Perguntei a um guarda da estação, num misto de espanhol e mímica, onde poderia comer. Apontou conhecida marca de fast food fora da estação. Coloquei a mochila nas costas e sai em direção a lanchonete, arrastando a mala pelas rodinhas. Almocei salada e frango grelhado e retornei a estação.
Uma das vantagens de viajar de trem é que a mala acompanha o viajante sem necessidade de acondicionar em bagageiros. Esse procedimento facilita e previne extravios durante os percursos.
Para Ferrara, dispensei auxílio para comprar passagem. A estação menor e o simpático guarda foram suficientes. O afastamento dos grandes centros causava inquietação. Afinal, estava em país estranho. Afastei os pensamentos de apreensão e fui tomado, pela primeira vez durante a viagem, de emoção indescritível. Lembrei minha avó e as descrições que fazia da terra natal dos pais. As estações de trem passando uma a uma, recordavam a narrativa da viagem dos emigrantes, feita por Leandro Fallavena em seu livro, Barão do Triunfo, Descobrindo a História. Adormeci por puro cansaço.
Feirão das Quintas Feiras 
Cheguei a Ferrara as 16h30. Aproximei do primeiro taxi e, com o motorista, chegamos a conclusão que o endereço do hotel da reserva discordava do voucher da companhia de turismo. Não poderia ser pior. Passei o número do telefone do hotel ao motorista que ligou imediatamente. Realmente o endereço não era Ferrara e sim Cento a cerca de 50 km. Perguntou se queria ir para a rodoviária. O cansaço desanimou de pegar ônibus e negociei a corrida a 60 euros. Partimos, afinal, estava perto. Chegamos ao hotel as 17h30.
Passeio pela rua central
Antes de subir ao apartamento para descansar, expliquei à atendente sobre as intenções na cidade. Respondeu-me que ligaria a uma amiga, escritora, ex assessora de cultura e, tinha o sobrenome Tassinari. Inicialmente prestei pouca atenção ao que falou. Paulatinamente, percebi a importância do contato. Servidora da cultura, fez a diferença e possibilitou a abertura de portas e registros históricos da cidade. A partir daí, entraram duas comarcas de Cento, igualmente importantes em registros históricos: Corporeno e Renazzo, onde Giuseppe passou infância e adolescência até a idade adulta. Meu bisavô diligentemente, agia para a viagem ser bem sucedida.