LEIA TAMBÉM:"ARQUIVO" e "PÁGINAS"

Dificuldades para comentar? Envie para o email : marcotlin@gmail.com
****************************************************

domingo, 11 de dezembro de 2011

NATAL SEM ERVA MATE

(foto Google Imagens)




Final de ano, sinônimo de confraternizações. É a vez da curtição e das lembranças de símbolos da infância. Seria omissão voluntária deixar de escrever sobre a época. Estou em Porto Alegre, são vinte horas e o calor de trinta e quatro graus encharca a camisa. Mesmo assim, como todo gaúcho que se preze, esquento água para chimarrão. A chaleira chia e abro um pacote de erva mate nova, recém-comprada no supermercado, que exala o cheiro de Natal da infância. Como? Paro e analiso. Porque a lembrança?
Recordo de Uruguaiana, onde residi entre os dois aos sete anos. A ansiedade era reprimida pelo Natal que iniciava apenas em vinte de dezembro. Hoje a data começa em princípio de novembro, de tal forma que quando chega a véspera de Natal, as crianças estão cansadas de Papai Noel. Em minha casa, quem assumia as tarefas relativas a chegada do bom velhinho, era a vó, que preparava a árvore para receber presentes cortando um pinheirinho nos matos perto da General Câmara. Enfeitava a base da árvore com presépio, manjedoura e miniaturas compradas em Libres de José, Maria, Reis Magos, ovelhas, burricos fincados no pasto verde de mentirinha, feito com erva mate. Tudo era feito às vésperas, depois que eu dormisse, pois “criança deve conservar o encantamento de Papai Noel”, dizia.
No dia seguinte, a surpresa. Em um canto da sala, a arrumação cuidadosa, com presentes embaixo da árvore. O cheiro forte da erva mate por dentro de casa, invadia todas os aposentos apesar das paredes de alvenaria de cerca de trinta centímetros de espessura. O forte odor circundava a árvore, os lagos artificiais formados por espelhos e o pasto oferecido às vacas de porcelana.
Quando mudei para Porto Alegre, após a separação dos pais, com oito anos, sentia o mesmo cheiro do Natal na árvore da tia Tedi, irmã da mãe que, assim como a vó, esmerava em conservar a tradição de aconchego de presentes embaixo do pinheirinho enfeitado com bolas multicoloridas e presépio.
Este referencial de cheiro de erva mate nos pés das árvores de Natal, esqueci ao longo dos anos. Em Brasília onde passei a residir, casado e com filhos, o hábito de montar presépios foi preservado em finais de anos. Mas o uso do pozinho verde para compor a paisagem do aparato natalino, nunca mais usei.
Usar mate como pasto dos animais de presépios gaúchos, aguçava a imaginação da gurizada, que ligava o odor aos presentes de Natal. Hoje, não encontro ninguém nos rincões gaúchos que permaneça com este hábito. Quem sabe no interior do estado! Em Porto Alegre, parece perdido entre as parafernálias eletrônicas, luzes, árvores artificiais e sacolas de presentes de grifes.
Em almoço na Tristeza, bairro onde morei até quinze anos e onde reencontro amigos, conversei sobre mais este nobre uso do mate. Foi quando alguém comentou que parou de usar quando os filhos, na correria de abrir presentes, espalharam o pó pela sala, sujando tudo.
Hoje, os pais não querem saber de sujeiras, Papai Noel fala inglês, toma coca-cola, uísque escocês e champanhe francesa. E os animais tradicionais em volta do presépio, não precisam de pasto, pois comem ração sabores arroz, salmão, frango. Os presentes, outrora roupas ou brinquedos fabricados a mão, hoje são eletrônicos sofisticados como Ipod, ifone, joysteacks, celulares multifuncionais e jogos cada vez mais violentos.
E a alegria, a ceia, o reencontro da família? Dependem do valor investido na festa.
Feliz Natal a todos.